* por José Luiz Jorge
(baseado no trabalho de Oscar Scarpatti)
O mestre da “Doma Índia”, o argentino Oscar Scarpatti deu ao mundo do Cavalo uma contribuição importante na formação do Cavalo de sela, trabalho ou esporte. Ele nos fala sobre como e por que “fazer a boca do cavalo” e a musculatura de nuca e pescoço, antes de se iniciar a chamada “doma de cima” ou o trabalho montado.
Na feitura da boca do cavalo temos de ter um cuidado especial, já que é uma das principais aptidões a ser levada em conta quando se analisar um cavalo.
Podemos ter um animal morfologicamente perfeito, de caráter normal e outras qualidades que, mesmo sendo ótimas e importantes, se o cavalo não tiver uma boa boca, e não tivermos facilidade em sua condução, ou se ele não for dócil a um leve toque na rédea, não nos serve para muita coisa. Além do que, pode ser tornar perigoso montar em um animal com esse comportamento.
Um cavalo bom de boca traz umas das qualidades mais destacadas porque é através desses comandos de equitação que conduzimos toda a potência e obtemos o melhor desempenho dele.
A comunicação que se pode obter entre cavalo e cavaleiro depende de uma sintonia fina, entre a nossa mão e boca, o que se dá por meio de sutis sinais transmitidos pelas rédeas. É tão ampla essa gama de sinais que surpreende e demonstra uma tremenda sensibilidade para a qual temos que estar muito conscientes e preparados.
A velha teoria que diz que o Cavalo tem que obedecer pela força e pela dor é infundada e além disso é um absurdo.
Por outro lado, nenhum destes meios brutais, sem consideração e carentes de cuidado dão resultados a médio ou longo prazo. Talvez a curto prazo funcione, enquanto a boca do pobre animal mantém a sensibilidade normal. Porém logo depois de repetidos erros colocados em pratica todos os dias chegaremos à uma dessensibilização pela formação de calos da mucosa bucal e a conseguinte resposta do Cavalo que manifesta um claro incomodo passando a língua sobre o freio e ou colocando-a para fora da boca.
Também se pode ver que alguns cavalos sacodem a cabeça para os lados ou de cima para baixo, mordem ou tratam de tentar morder a embocadura, apertam as mandíbulas com força. Isto traz junto outro sério problema que em geral é atribuído à boca; a rigidez da nuca pela contração da musculatura do pescoço que se inserta na cabeça, que termina agarrotando-se junto com a zona do maxilar inferior.
Colocação do bridão
Logo depois de tomar contato com o potro e em pleno trabalho da dessenbilização, o Horseman pode começar a construir a boca de seu potro. Recordemos que para ele tudo é novidade, desconhecido; que tudo deve ser proporcionado a seu estado e devemos ser cuidadosos não só “no que fazemos” já que é tão importante quanto o “como o fazemos”.
Devemos saber o que buscamos. Isto é o essencial: o que se pretende é ir acostumando nosso cavalo para que aceite que lhe introduzamos na boca uma embocadura com uma cabeçada para sustentá-lo. Primeiro lhes causará incômodo, porém logo a seguir ele terminará por aceitá-lo, sempre e quando não fizermos esse procedimento inicial com muito cuidado e objetividade ao mesmo tempo, podemos cometer erros como causar-lhe dores ou desconforto que não possa suportar.
Lembrem-se que nessa fase, a da passagem da doma de baixo para o trabalho montado, quando ele está saindo do jardim da infância e entrando na escola primnária, cada novidade precisa ser aceita e consolidada antes de se passar adiante. Subimos junto com ele, degrau por degrau da longa escada do aprendizado.
Um incômodo pode ser reduzido ao mínimo, desde que tenhamos cuidado, bom trato e recompensas, como e não deixá-la na boca mais de meia hora, nas primeiras vezes, usando a rédea longa do charreteamento presas ao selote de doma, sem acionar com força, apenas consuzindo-o com leveza, ele não nasce pronto e não vai aprender nada nas primeiras sessões, mas pode sentir dor se errarmos e aí a impressão gravada em sua mente sobre a sensação de trabalhar com embocadura será a pior possível ensejando resistências mais adiante.
Conformação da boca
Fisiologicamente a boca do Cavalo é formada pelo Espaço entre dentes, aquele trecho da mandibula sem dentes, onde exatamente passará a embocadura, a Língua, as Comissuras da boca, onde a embocadura toca sob o efeito da ação das rédeas, o lábio inferior, a Pêra ou parte posterior do lábio inferior, também conhecido como “mento”, o
Pálato (céu da boca) no qual não deveria haver nenhuma ação.
Qual é a função do trabalho da boca? A função é conseguir manejar e conduzir o Cavalo com efetividade.
Na realidade o que chamamos de boca no Cavalo, para fins de equitação, se refere especificamente ao seu maxilar inferior e à comissura dos lábios.
A boca está relacionada com a musculatura dos maxilares, o pescoço e em particular a nuca:
Como se consegue fazer-lhe a boca sem dor nem traumas, sensivelmente?
Sabendo todos os fatores que a comprometem:
Boca
Nuca
Pescoço
Força geral do animal
Equilíbrio, aí compreendido o centro de gravidade, (já que deve aprender a mover-se com outro peso além do seu próprio, basta observar o cavalo, como ele se coloca quando anda solto no campo e como muda a altura da cabeça quando tem um peso sobre a garupa. Essa colocação de cabeça tem a ver com o novo centro de gravidade para ajustar-se a um cavaleiro e também tem implicação na sua visão. Além disso deve ser considerada a Maturidade psíquica na aprendizagem. Por isso não iniciamos cavalos com menos de tres anos.
Quando começar a fazer a boca?
Quando cabresteamos o potro, no primeiro passo da doma, começamos a trabalhar na maioria dos fatores que comprometem la boca.
A sensibilidade na boca deve ser cuidada porque ante a menor dor ou trauma produz uma reação defensiva contraindo todos os músculos comprometidos no maxilar e a nuca obstruindo ou dificultando o manejo.
Um Cavalo dócil e brando de boca se pode por a perder em pouco tempo por cometer o erro de levar sempre as rédeas curtas sem deixar que estire o pescoço.
É importante saber o rol que cumprem as rédeas e a sensibilidade que devemos ter nas mãos.
Pontos de vista:
Se conseguirmos mudar certos conceitos errôneos em que se apóiam alguns dos domadores tradicionais, teremos dado passos determinadamente positivos em relação ao amansamento e docilidade de nossos cavalos.
Vamos descrever brevemente alguns aspectos:
O cavalo está recém encabrestado e por conseguinte está:
-desconfiado,
-cosquento,
-temeroso,
-espantadiço,
-chucro ou outros adjetivos que ouvimos sempre.
Vemos talvez isso, porém não fazemos nenhuma análise da psicologia do potro, porque em geral não nos colocamos no lugar dele, não admitimos o direito dele se proteger de nós e da ameaça que representamos.
Porém do ponto de vista do animal, as coisas são diametralmente opostas.
Se ele pudesse falar no nosso idioma, diria:
“Não entendo o que você quer, porque assim que começo a te ver e a ter você perto, quando está comigo me mantém prisioneiro, me tiraniza’.
Eu tenho medo de você. Tuas atitudes são de ataque’.
‘Teus gestos são angulosos, teus olhos são penetrantes’.
Depois.
‘Me dói a nuca e o pescoço, por quê me amarrou a um tronco’?
‘Me dói a boca, porque me mete um couro duro debaixo da língua, e me tiraniza’, ‘Me aperta com uma cincha e me põe alguma coisa no lombo, me parece que não posso nem respirar”.
E em realidade o que ele está dizendo em sua própria linguagem e nós o compreenderíamos perfeitamente se tivéssemos um mínimo conhecimento de sua linguagem, natureza e comportamento.
A linguagem do cavalo é corporal e ele se comunica com clareza:
– Quando nos aproximamos ele escapa. – “Tenho medo”.
– Retrai os lábios e abaixa as orelhas, arregala os olhos, mostrando a parte branca. – “Se você se aproximar mais um passo, te mordo”.
Nos aproximamos agressivamente e ele vira a sua anca. – “vou te escoicear”.
Pisoteia o chão batendo uma pata depois a outra com força, repetidas vezes – “Estou impaciente”.
O tocamos e ele retrai a pele com rapidez. – Está me fazendo cócegas.
Estira o pescoço e dirige seus olhares para os outros – está tratando de ver sinais de adrenalina.
A lista é numerosa e a poderíamos desenvolver um livro todo sobre linguagem do cavalo. De acordo com Scarpatti, “com cinqüenta anos de convivência e sistemática observação e estudo eu pude determinar com clareza a sua linguagem e isso tem sido permanentemente, a chave mestra para entender sua notável e sensível psicologia.
Um dos erros mais comuns e contraproducentes neste processo inicial é tirar o cavalo na boca. A tirada da boca quando mal se começa a doma do nosso cavalo diríamos que é a primeira coisa que nos preocupa porque está ligado a nosso interesse por dominar o cavalo e nos sentirmos seguros montados nele”. Isso é feito sempre com dor, já vi casos no Sul do Brasil de “tirarem a boca” com corrente fina passando sobre a lingua, ferindo-a gravemente.
Tenho a convicção de que uma das mais importantes virtudes que um cavalo deve ter é sua docilidade para ser manejado e conduzido. E esta ação tem que ser levada a cabo por qualquer pessoa desde uma criança até um cavaleiro experiente.
Nos primeiros momentos o cavalo não está em condições de aprender porque está muito preocupado por tudo o que está se sucedendo, pela diversidade de situações novas, que ao serem tantas e quase simultâneas que não termina por entender nenhuma. Por isso não podemos pensar que a primeira coisa que devemos fazer é acovardar o cavalo tirando-lhe a boca.
Devemos abordar a boca do cavalo como se faz com uma obra de arte. Quem quer fazer esta obra de arte deve ter profundos conhecimentos do que quer atingir e também contar com tempo suficiente para levar a cabo esta delicadíssima tarefa.
Na doma, tudo é ensinamento, porém deve ser proporcionada no tempo de cada animal, pautada e progressivamente. É um erro muito generalizado começar pela boca, fazer a boca do cavalo nas primeiras encilhadas é violento, eu diria, muito violento, e na realidade não podemos pretender ensinar nada a ninguém com violência. Fazer a boca não é um ensinamento já que não lhe demos tempo de compreender que isso é só um dos tantos exercícios que iremos lhe ensinar nos próximos meses de suas vidas.
*José Luiz Jorge é proprietário do Rancho São Miguel
Instrutor nivel 4 do CHA (Certified Horsemanship Association)
autor do livro Conversando sobre Cavalos.