O compromisso com o Bem Estar animal, no trabalho com Cavalos deve ser compreendido como uma opção integral, em todos os aspectos de nossa relação com eles, e não apenas um discurso politicamente correto, enquanto o Cavalo faz de modo “obediente” o que é solicitado.
Quanto mais aumentam as informações disponíveis, ao alcance de todos, sobre a Natureza comportamental, a linguagem e o que o Cavalo nos pede quando relaciona-se com as pessoas, mais vemos algumas pessoas aderirem a esse tema, e comprovarem os resultados dessa abordagem.
O problema é que, como ocorre em outras áreas, ainda vemos muita distância entre o falar e o agir.
Compromisso integral
Entendemos como compromisso integral a sua aplicação e respeito em todos os aspectos do manejo, em Haras, Hípicas, Ranchos e Centros Equestres.
Instalações
Na hospedagem em mais de 95% dos locais desconsidera-se ou por tradição ou comodismo a natureza do Cavalo como animal de manada. Ele sente-se seguro, confiante e calmo, quando tem esse aspecto essencial para os animais predados, respeitado.
Ah, podem dizer, mas isso só se aplica ao manejo a campo, em piquetes, onde o sentido de manada existe. Na vida em confinamento ou semi-confinamento em baias ou cocheiras isso acaba.
E por que? Porque na quase totalidade dos estabelecimentos as baias são fechadas até o teto, e inibe-se o contato físico e visual entre animais, mesmo se tratando de cavalos inteiros. Aqui no Rancho São Miguel nossa experiência prática há quase 20 anos mostra o oposto. Nossas baias tem pouco mais de meia parede entre os machos e meia parede em todos os lados para fêmeas. Resulta disso aliado a outros fatores trazidos pelo Horsemanship, em cavalos calmos, centrados, sem nenhum dos vícios de confinamento. Aqui não existem cavalos que mordem, que escoiceam, que comem fezes, que engolem ar, que manifestam a chamada dança do urso,
Baias ventiladas com conforto, espaço, camas boas secas e sem pó, água fresca à vontade nos bebedouros automáticos, limpeza duas vezes ao dia, soltá-los parte do dia em piquetes, mudar a rotina, baia, pista, treino, banho, baia, incluindo “momentos de lazer na manada” espaço para pastejar após o trabalho, não com objetivo nutricional, mas proporcionar o simples arranchamento de capim, promovem bem estar físico e mental.
Já temos diversos registros de reabilitação mental aqui, de cavalos de fora que vieram cheios de bardas e a chave para refazer a confiança do cavalo nas pessoas é aplicar os conceitos do Horsemanship.
Quais são esses conceitos e como eu defino o Horsemanship?
A expressão na língua inglesa seria ao pé da letra: horse=cavalo, man=Homem, ship, da palavra relationship que quer dizer relacionamento. Só que muitos estudiosos e treinadores experientes se limitam a ver a expressão ao pé da letra e ponto. Não é assim! Não é a toa que horse (cavalo), vem na frente. Isso muda tudo. Poque Bill Dorrance em seu livro épico, O verdadeiro Horsemanship através do sentimento (feeling) define toda a essência. O relacionamento se estrutura do ponto de vista do cavalo. Na linguagem do cavalo e no tempo de cada cavalo que é único. ISSO FAZ TODA A DIFERENÇA.
E aqui nós ensinamos as pessoas que vem fazer nossos cursos e clinicas e tentar se colocar sempre a cada ação, no lugar do cavalo, (mentalmente), e assim aprender a ler o cavalo e aliviar a pressão no momento certo; essa a base da confiança dele em nós.
Então vamos construir juntos?
O Cavalo aprende no alivio da pressão
A linguagem do Cavalo na natureza se baseia em pressão e alivio
O Cavalo espera de nós clareza na comunicação, respeito ao seu tempo e alivio para ele agir e responder
Quando o Cavalo bão faz o que lhe pedem, isso se dá por três razões possíveis;
- Não sabe, não aprendeu, não foi apresentado a ele antes
- Não teve tempo de responder e já foi mais pressionado ou apanhou e ficou confuso
- Os pedidos foram contraditórios, exemplo, pediu-se algo com as pernas e outra coisa diferente com as mãos e o corpo
Voce não ensina nada ao Cavalo, você permite que ele aprenda. E vc aprende junto com ele.
Cada cavalo é único, com sua história de vida, seu tempo, e o que vc fez com um, nem sempre serve a outro.
O Cavalo numa escala de zero a dez, supera o homem em várias notas. Ele sabe o que você sabe e o que você não sabe, inclusive sobre você e seus medos escondidos atrás da estupidez e da violência.
A pele do cavalo tem mais terminações nervosas que a nossa pele, ele sente mais dor do que nós, mas tem uma enorme capacidade de suportá-la quieto, esperando que o estúpido que lhe agride sem ele saber porque acorde e leia o que ele está dizendo.
O treinador se adapta a cada cavalo e não o contrario
O que o cavalo quer? Sentir-se seguro e viver em paz. Quem lhe confunde e ameaça é o Homem
O Cavalo sente cheiro de hormônios à distância. Inclusive o da Adrenalina que o Homem exala quando tem medo e tenta esconder esse medo com agressividade.
A adrenalina está gravada na memoria do cavalo como sinal de perigo, porque tem o mesmo cheiro da adrenalina da onça ou do lobo que lhe atacam a campo, desde sempre.
O cavalo tem medo do seu (cheiro de) medo então
Quando vejo um treinador espancar um cavalo, eu leio, esse cara diz que é bom, mas se borra de medo de cavalo e esconde isso sendo violento e agressivo sem necessidade. E são esses mesmos que dizem que Horsemanship e Bem estar animal “ é frescurada”.
Nesse cenário, quando o cavalo retesa o pescoço, arregala os olhos, aperta o beiço, sobe a cabeça e empina, não é hora de fazer nada, pedir nada até que ele sinta sua intenção e relaxe e mastigue, a continuar na hora que ele dá sinais de defesa e medo, a brutalidade, então ele empina e tenta se soltar, pode estirar, bolear (reações de fuga e pânico) causadas pela pessoa despreparada que o açoita ou pressiona na hora errada, e se não conseguir fugir, então ele manoteia, escoiceia e tenta morder.
Então, que estraga o cavalo é o despreparado e ainda o cavalo leva nome de ruim, de problema ou cavalo mau.
Não existe cavalo problema. Somente pessoas com problema (de não saber ler e sentir o que o cavalo sente e pede, as vezes gritando em silencio).
Na foto, uma égua “chucra” de campo, sendo casqueada, desamarrada, no Rancho São Miguel
Cansei de ver treinadores ditos experimentados, cobrirem o cavalo no chicote sem resultado
O bem estar animal, então se resolve em cada procedimento do dia-a-dia. Na tosa de orelha sem precisar pito, torcer ou pendurar nas orelhas, mão “amiga”, chicote, na hora do casqueamento e ferrageamento, na hora de limpar a cocheira onde tratadores desqualificados batem com cabo do garfo nas costelas do cavalo para ele ficar longe.
Há muito a ser feito para podermos evoluir ao nível do Cavalo;
E nesse rumo é que estão a equitação natural, sem ferro na boca e em certo sentido sem ferro nos pés. (bitless e barefoot);
O bem querer e o respeito ao Cavalo estão na base do Horsemanship da política de bem estar, a meu ver fora dessa linha o limite entre o mínimo necessário e os maus tratos é um fio de cabelo.
O mesmo se aplica ao uso de força abusiva na ação de rédeas com ferro, que causa graves danos à boca, maxilar, dentes, ossos faciais, nervos e músculos da cabeça e da nuca.
O mesmo se dá com provas prematuras de potros muito jovens, com o treino excessivo em potros cujas estruturas de músculos, ossos e tendões ainda não estão formadas;
Quem monta, inclusive ganha provas de marcha, apoiando pesadamente na boca do cavalo, como se fosse correto reunir o cavalo da frente para trás, também viola o conceito de bem estar animal e é por esse conjunto de temas, cada um dos quais renderia horas de conversa, que insisto em afirmar que bem estar animal e Horsemanship pedem uma abordagem integral e não pela metade ou em partes.