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Bem Estar animal, ou você tem o compromisso ou não tem

O compromisso com o Bem Estar animal, no trabalho com Cavalos deve ser compreendido como uma opção integral, em todos os aspectos de nossa relação com eles, e não apenas um discurso politicamente correto, enquanto o Cavalo faz de modo “obediente” o que é solicitado.

Quanto mais aumentam as informações disponíveis, ao alcance de todos, sobre a Natureza comportamental, a linguagem e o que o Cavalo nos pede quando relaciona-se com as pessoas, mais vemos algumas pessoas aderirem a esse tema, e comprovarem os resultados dessa abordagem.

O problema é que, como ocorre em outras áreas, ainda vemos muita distância entre o falar e o agir.

Compromisso integral

Entendemos como compromisso integral a sua aplicação e respeito em todos os aspectos do manejo, em Haras, Hípicas, Ranchos e Centros Equestres.

Instalações

Na hospedagem em mais de 95% dos locais desconsidera-se ou por tradição ou comodismo a natureza do Cavalo como animal de manada. Ele sente-se seguro, confiante e calmo, quando tem esse aspecto essencial para os animais predados, respeitado.

Ah, podem dizer, mas isso só se aplica ao manejo a campo, em piquetes, onde o sentido de manada existe. Na vida em confinamento ou semi-confinamento em baias ou cocheiras isso acaba.

E por que? Porque na quase totalidade dos estabelecimentos as baias são fechadas até o teto, e inibe-se o contato físico e visual entre animais, mesmo se tratando de cavalos inteiros. Aqui no Rancho São Miguel nossa experiência prática há quase 20 anos mostra o oposto. Nossas baias tem pouco mais de meia parede entre os machos e meia parede em todos os lados para fêmeas. Resulta disso aliado a outros fatores trazidos pelo Horsemanship, em cavalos calmos, centrados, sem nenhum dos vícios de confinamento. Aqui não existem cavalos que mordem, que escoiceam, que comem fezes, que engolem ar, que manifestam a chamada dança do urso,

baias sociais e bem estar

Baias ventiladas com conforto, espaço, camas boas secas e sem pó, água fresca à vontade nos bebedouros automáticos, limpeza duas vezes ao dia, soltá-los parte do dia em piquetes, mudar a rotina, baia, pista, treino, banho, baia, incluindo “momentos de lazer na manada” espaço para pastejar após o trabalho, não com objetivo nutricional, mas proporcionar o simples arranchamento de capim, promovem bem estar físico e mental.

Já temos diversos registros de reabilitação mental aqui, de cavalos de fora que vieram cheios de bardas e a chave para refazer a confiança do cavalo nas pessoas é aplicar os conceitos do Horsemanship.

Quais são esses conceitos e como eu defino o Horsemanship?

A expressão na língua inglesa seria ao pé da letra: horse=cavalo, man=Homem, ship, da palavra relationship que quer dizer relacionamento. Só que muitos estudiosos e treinadores experientes se limitam a ver a expressão ao pé da letra e ponto. Não é assim! Não é a toa que horse (cavalo), vem na frente. Isso muda tudo. Poque Bill Dorrance em seu livro épico, O verdadeiro Horsemanship através do sentimento (feeling) define toda a essência. O relacionamento se estrutura do ponto de vista do cavalo. Na linguagem do cavalo e no tempo de cada cavalo que é único. ISSO FAZ TODA A DIFERENÇA.

E aqui nós ensinamos as pessoas que vem fazer nossos cursos e clinicas e tentar se colocar sempre a cada ação, no lugar do cavalo, (mentalmente), e assim aprender a ler o cavalo e aliviar a pressão no momento certo; essa a base da confiança dele em nós.

Então vamos construir juntos?

O Cavalo aprende no alivio da pressão

A linguagem do Cavalo na natureza se baseia em pressão e alivio

O Cavalo espera de nós clareza na comunicação, respeito ao seu tempo e alivio para ele agir e responder

Quando o Cavalo bão faz o que lhe pedem, isso se dá por três razões possíveis;

  1. Não sabe, não aprendeu, não foi apresentado a ele antes
  2. Não teve tempo de responder e já foi mais pressionado ou apanhou e ficou confuso
  3. Os pedidos foram contraditórios, exemplo, pediu-se algo com as pernas e outra coisa diferente com as mãos e o corpo

Voce não ensina nada ao Cavalo, você permite que ele aprenda. E vc aprende junto com ele.

Cada cavalo é único, com sua história de vida, seu tempo, e o que vc fez com um, nem sempre serve a outro.

O Cavalo numa escala de zero a dez, supera o homem em várias notas. Ele sabe o que você sabe e o que você não sabe, inclusive sobre você e seus medos escondidos atrás da estupidez e da violência.

A pele do cavalo tem mais terminações nervosas que a nossa pele, ele sente mais dor do que nós, mas tem uma enorme capacidade de suportá-la quieto, esperando que o estúpido que lhe agride sem ele saber porque acorde e leia o que ele está dizendo.

O treinador se adapta a cada cavalo e não o contrario

O que o cavalo quer? Sentir-se seguro e viver em paz. Quem lhe confunde e ameaça é o Homem

O Cavalo sente cheiro de hormônios à distância. Inclusive o da Adrenalina que o Homem exala quando tem medo e tenta esconder esse medo com agressividade.

A adrenalina está gravada na memoria do cavalo como sinal de perigo, porque tem o mesmo cheiro da adrenalina da onça ou do lobo que lhe atacam a campo, desde sempre.

O cavalo tem medo do seu (cheiro de) medo então

Quando vejo um treinador espancar um cavalo, eu leio, esse cara diz que é bom, mas se borra de medo de cavalo e esconde isso sendo violento e agressivo sem necessidade. E são esses mesmos que dizem que Horsemanship e Bem estar animal “ é frescurada”.

Nesse cenário, quando o cavalo retesa o pescoço, arregala os olhos, aperta o beiço, sobe a cabeça e empina, não é hora de fazer nada, pedir nada até que ele sinta sua intenção e relaxe e mastigue, a continuar na hora que ele dá sinais de defesa e medo, a brutalidade, então ele empina e tenta se soltar, pode estirar, bolear (reações de fuga e pânico) causadas pela pessoa despreparada que o açoita ou pressiona na hora errada, e se não conseguir fugir, então ele manoteia, escoiceia e tenta morder.

Então, que estraga o cavalo é o despreparado e ainda o cavalo leva nome de ruim, de problema ou cavalo mau.

Não existe cavalo problema. Somente pessoas com problema (de não saber ler e sentir o que o cavalo sente e pede, as vezes gritando em silencio).

egua de campo, casqueada solta

Na foto, uma égua “chucra” de campo, sendo casqueada, desamarrada, no Rancho São Miguel

Cansei de ver treinadores ditos experimentados, cobrirem o cavalo no chicote sem resultado

O bem estar animal, então se resolve em cada procedimento do dia-a-dia. Na tosa de orelha sem precisar pito, torcer ou pendurar nas orelhas, mão “amiga”, chicote, na hora do casqueamento e ferrageamento, na hora de limpar a cocheira onde tratadores desqualificados batem com cabo do garfo nas costelas do cavalo para ele ficar longe.

Há muito a ser feito para podermos evoluir ao nível do Cavalo;

E nesse rumo é que estão a equitação natural, sem ferro na boca e em certo sentido sem ferro nos pés. (bitless e barefoot);

O bem querer e o respeito ao Cavalo estão na base do Horsemanship da política de bem estar, a meu ver fora dessa linha o limite entre o mínimo necessário e os maus tratos é um fio de cabelo.

O mesmo se aplica ao uso de força abusiva na ação de rédeas com ferro, que causa graves danos à boca, maxilar, dentes, ossos faciais, nervos e músculos da cabeça e da nuca.

O mesmo se dá com provas prematuras de potros muito jovens, com o treino excessivo em potros cujas estruturas de músculos, ossos e tendões ainda não estão formadas;

Quem monta, inclusive ganha provas de marcha, apoiando pesadamente na boca do cavalo, como se fosse correto reunir o cavalo da frente para trás, também viola o conceito de bem estar animal e é por esse conjunto de temas, cada um dos quais renderia horas de conversa, que insisto em afirmar que bem estar animal e Horsemanship pedem uma abordagem integral e não pela metade ou em partes.

Do Horsemanship para a chamada Equitação Natural: evolução no conceito de bem estar animal

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Quem acompanha nosso trabalho há algum tempo sabe que temos adotado como linha central :- “que estamos aqui pelo Cavalo”. Mas, depois desses 20 anos, trabalhando na filosofia do Horsemanship, não atuamos por modismo, nem tampouco para fazermos exibições ou showhorse. Nossos cursos e atividade tem ganho milhares de pessoas para aprenderem a observar o mundo do ponto de vista e na linguagem do Cavalo.

Então, para além da escolarização, nossa filosofia se aplica no manejo diário, nas instalações sociaveis, no encilhamento com eles soltos a nosso lado, no imprinting de potros, (que nada tem a ver com doma prematura), no uso do bitless bridle (equitação soft – ou sem ferro na boca).

Agora estamos dando o próximo passo, com atraso de alguns anos em relação à Europa, ao colocarmos claramente a questão da opção pelo barefoot (cavalos sem ferro nos pés), ou equitação Natural.

Para isso temos a nosso favor uma grande evolução na compreensão da fisiologia dos cascos, na necessidade de promover movimento natural nas estruturas internas, ampliando a irrigação e circulação sanguinea dentro dos cascos como fator de cura e saúde, e prevenção de doenças agavadas pelas condições de confinamento e uso permanente de cravos e sapatos de ferro tradicionais que favorecem (não causam), o surgimento de doenças, das mais superficiais às mais graves, como laminites.

Manejo Natural

Os cavalos selvagens, andam a pé , muitas vezes,50 km todos os dias, e têm casco duros e bem ajustados, apesar de nunca terem tido ferraduras.

Aqui temos ¾ da tropa a campo e são profundas e nitidas as diferenças entre a saude dos cascos deles, com o que se tem no ¼ dos animais semi confinados, considerando ainda padrão ótimo de camas e manejo sanitário, muito acima da media geral dos locais que hospedam cavalos.

É um mito que perdura milenios, de que a ferradura seja um “mal necessário”… é possível para a maioria dos cavalos trabalhar sem ferraduras. Muitos dos cavalos que trabalham livres da ferradura demonstram em todas as observações, a campo e cientificas, que estão muito mais saudáveis e felizes.

Segundo relatos da Associação Portuguesa para Equitação Natural, “..estudos recentes permitiram estudar a mecânica do casco do cavalo e como podemos alcançar os cascos duros, bem ajustados e saudáveis que a natureza destinou para o seu cavalo”.

Alguns cavalos sem ferraduras competem em provas de enduro equestre, nos mais variados e agressivos terrenos, percorrendo mais de 100 Km, ou nas provas de dressage, hipismo clássico e CCE e nas corridas.

Muitos proprietários de cavalos não têm nenhuma ideia se o seu ferrador faz um bom trabalho ou não … mas para ter um bom desempenho o cavalo precisa dos seus 4 cascos em perfeitas condições de aprumos, angulação, profundidade de ranilhas e favorecimento do movimento natural em todas as direções, com a liberdade para as estruturas de apoio, o que a ferradura tradicional limita.

As técnicas de manutenção de cavalos com os cascos descalços, podem ser facilmente aprendidas por qualquer pessoa que se interesse o suficiente para estudar o assunto.

Os grandes ferradores profissionais devem ver esta técnica como uma oportunidade e não como uma ameaça … uma vez que deixam de ter clientes e passam a tê-los como pacientes, que receberão os melhores cuidados de podologia.

Muitos cavalos que sofrem de problemas de cascos e doença do navicular podem ser tratados com sucesso e reabilitados sem ferraduras, bem como os que apresentam quebras na muralha do casco e fragmentação na área onde são aplicados os cravos.

Os cavalos são animais que vivem na natureza em manadas, e essa organização social grupal, os protege do ataque de predadores. O seu sistema de comunicação altamente desenvolvido e é usado principalmente através da linguagem corporal ajustada também para ler o comportamento das espécies predadoras, assim eles conseguem frustrar tanto fisicamente como emocionalmente potenciais predadores na luta pela sobrevivência. Os seres Humanos são predadores, olhos na frente, adrenalina saindo pela pele, que levam os cavalos a adotar com frequência, no manejo tradicional, a reações de defesa e fuga, à desconfiança e a acionarem esses seus mecanismos de defesa e dependendo do carácter do animal a ter reações “mais agressivas”, só que além disso, o desconforto, incômodos, dores também alteram o “humor” dos cavalos.

As pessoas não são treinadas a ver o mundo do ponto de vista do Cavalo, e não analisam as causas dessas reações, na maioria das vezes, sentem-se desafiadas e querem disciplinar o cavalo, interpretando as reações naturais como bardas, violência, e pretendem resolver essas situações aumentando a pressão, aumentando a violência, o que agrava as respostas de defesa e fuga numa espiral que termina por inutilizar aquele cavalo.

Nós, no Horsemanship estudamos o comportamento dos Equinos, (Ethologia), de modo a que possamos aprender a ler o cavalo e sua linguagem corporal, com a finalidade de compreender seus os sentimentos e intenções.

Devemos aprender a convencer os cavalos, pela nossa atitude, cheiro, energia, que o cavalo pode confiar em nós, que não somos uma ameaça, aprender a falar a linguagem Natural e corporal do Cavalo, para que eles, no seu tempo próprio nos reconheça como a um deles.

Nossos cursos de Horsemanship servem para você aprender a realizar essa comunicação mais refinada, nada racional, então você terá uma boa comunicação com eles.

Quando você conseguir ganhar a confiança do cavalo, sendo ele um animal de manada, você coloca toda aquela energia dele a serviço de um estimulo para o contato, para o convívio, no trabalho, nas provas e no lazer numa relação de total parceria. Um cavalo calmo, com confiança, aprende muito mais rapidamente a viver e entender o mundo dos humanos e aceitando de bom grado os desafios mentais que o Homem (treinador, equitador, cavaleiro) apresentar no dia-a-dia.

Claro que isso é muito mais seguro quando montado tornam-se um só. A ideia passa a ser a de que os dois juntos tornem-se um só.

Os ganhos de saúde são naturais, uma eliminado o medo e stress, as defesas naturais, a oxidação das células, os vícios e problemas comportamentais podem desaparecer rapidamente quando uma abordagem mais natural é levada para um treino de cavalos fundado no bem-estar.

Buscamos criar uma relação de confiança, cooperação, respeito e preservar a sua dignidade, sem a utilização do medo, da violência ou de coerção física. Horsemanship também forma e treina as pessoas, é assim e principalmente um sistema de educação de pessoas a ler e treinar cavalos. Os Cavalos já sabem como ser cavalos…e sabem o que somos, a ideia aqui é surpreende-los positivamente, estando abertos a aprender com eles uma vez que nem sempre sabemos como lidar com toda aquela emoção, que amplifica nosso próprio modo de ser, de ver e de agir.

A opção pelo Barefoot ou equitação Natural, é uma evolução da abordagem do Horsemanship, como é o Bitless (sem ferro na boca), onde cavalo e cavaleiro não formam um conjunto, mas um só ser, mais forte e determinado que os dois separadamente.

“A equitação natural é o equilíbrio de entendimento entre o Cavalo e o Homem, é a aceitação através da comunicação estabelecida, assim, mais do que montar um cavalo é a partilha de um momento com a maior proximidade entre o Cavalo e o seu amigo Homem…” situa muito bem Janet Hakeney.

Ou como define a APEN (Associação Portuguesa de Equitação Natural), : “Seja qual for a modalidade ou o objetivo a realidade entre o cavaleiro e montada pode mudar para melhor com a introdução do método da equitação natural, tudo aquilo que não entende sobre o seu cavalo ou mesmo aquilo que o cavalo não entende de sobre si, pode ser transformado em comunicação e entendimento gerando a confiança e tranquilidade necessária para obter melhores resultados, criando a satisfação e a harmonia num dia de trabalho ou num mero passeio”.

DEVEMOS CRIAR CONDIÇÕES PARA O CERTO FICAR FÁCIL E O ERRADO, DIFÍCIL

Este texto é continuação do anterior, quando falei sobre reconhecer cada cavalo como único. Quando começo com um novo cavalo, em fase inicial de escolarização, costumo dedicar um tempo para observá-lo de perto. Tento ir para a mente dele, lendo os sinais que ele me dá sobre cada novidade que é apresentada a ele, quais são os primeiros sinais corporais que ele utiliza para dizer o que sente a respeito de tudo aquilo.

Essa é a grande diferença, alcançada com o tempo, entre um treinador comum, ou um “horseman”, praticante da linguagem natural do cavalo.

Usar o instinto, a intuição, para ver o mundo do ponto de vista do cavalo e não do seu próprio, pessoal, dominante, preso a prazo, a relógio.

Vai começar a ensinar um cavalo? O tempo é o de cada cavalo e não o seu próprio tempo.

É essa uma das chaves que nos poupa e ao cavalo de cometermos erros básicos que nos levam a um caminho de confrontação desnecessária. E a que tempo eu me refiro? Ao tempo que cada cavalo precisa para compreender o que está sendo solicitado. E como ele compreende? Do ponto de vista da sua segurança. Ele precisa sentir que pode confiar, que não está se metendo em uma enrascada. Precisa confiar no treinador

Tudo porque falhar no inicio, na leitura do Cavalo, nos leva a ações que chegam em ruas sem saída, com ele. Ai, tem de retornar e o prejuízo começa em vários sentidos.

Quando não reconhece isso, o treinador que leu errado, confunde auto preservação e necessidade de sentir-se seguro que o Cavalo manifestou, com teimosia, com desafio, com malacarice e para esses, castigo ou punição.

Justamente aí começam os problemas com diversos cavalos que não explodem todo seu potencial, que não reagem bem ao treino, que não puderam ser francos e que foram na compreensão deles, agredidos sem razão lá atrás.

O treinador de então, confirmou na mente dele, ao errar a leitura nos primeiros dias, que somos sim predadores, perigosos, que nossa convivência é dolorosa e o vivente então mata em vida todo dia um pouco o espirito daquele cavalo.

Isso não é conto de fadas e nem frescura, falando bom português.

Há pesquisas realizadas em Universidades da França sobre comportamento, emoção, memória, capacidade de associar pessoas, cheiros, a situações boas ou ruins que o ser Cavalo têm e nós ao longo de décadas nem sabíamos como era.

Quando um cavalo não atende uma solicitação, feita de baixo ou montado, Você já parou para se perguntar se aquilo já foi ensinado antes? Um cavalo não responde de acordo com o esperado porque ele pode não saber fazer, porque não teve tempo, ou porque o pedido foi confuso. Ou ainda porque a energia do treinador era ruim, cheia de adrenalina, dominância, raiva da sua impotência em fazer ele compreender e aí ele castiga e desconta no cavalo.

Agressões, chicotadas, dor, sempre confirmam a pior impressão dele sobre nós:  a de que somos uma ameaça dolorosa, e o bom treinador nunca deve sentir-se desafiado pelo cavalo. Não se deve querer ensinar algo, deve-se permitir que ele aprenda, no tempo dele e com base em confiança e em saber aliviar a pressão na hora exata, pois eles aprendem no alívio da pressão.

Isso é básico e é onde vejo com certa tristeza, treinadores experientes, ainda querendo quebrar o cavalo, tirar a boca, chicotear, porque sentiram-se desafiados . Observe neste vídeo as lesões que chicotadas na região do vazio causam, acessando o link ou copiando e colando no seu navegador; https://youtu.be/PMfcc0hzGMU . A pele do cavalo é mais fina e com muito mais terminações nervosas (que transmitem a sensação de dor ao cérebro) do que a nossa. Além de que chicotear um cavalo que está perdido no trabalho é também uma covardia.

Então o Cavalo, que é predado na natureza, que é comida para os outros animais, quer o quê?

Quer sossego, quer segurança, quer poder confiar e aí revelar-se um de nossos melhores parceiros milenares, no esporte, no trabalho, no lazer, na vida em geral.

E é nossa responsabilidade saber de tudo isso e agir com ele desse ponto de vista.

O cavalo precisa que nossa aproximação, nosso contato, nossas ações façam sentido na mente dele desse ponto de vista;

– “ Ei, isso que você está trazendo para colocar em mim, é dolorido? É perigoso? Vai me colocar em risco?”

Ou então:

– Amigo, posso te chamar assim? Esse ferro, essas coisas que tu utiliza para me chinchar as costelas são mesmo pra ser usadas desse modo? Não dá pra fazer de outra forma, por exemplo, você me explica certinho na minha linguagem o que quer e confie que eu vou fazer meu melhor”…

Você já imaginou esse diálogo entre o treinador, ginete e seu cavalo, nas primeiras sessões de doma, ou escolarização, como chamamos hoje.

Pois saiba que é exatamente essa a abordagem que faz sentido para eles, só que é claro, sem palavras, mas na linguagem corporal.

Você se aproxima, ele se encolhe, encrispa o pescoço, arrepia pelo, arregala olhos, mostra o branco dos olhos, comprime os beiços, …. o que você faz?

-ah amarro bem curto, jogo as tralhas em cima e vamos pro embate….

Não precisa ser assim.

Não temos duas chances de causar uma primeira boa impressão.

Converse o cavalo, chegue-se sem olhar nos olhos, ombros baixos, relaxado, toque ele de lado, na tala do pescoço, relaxe ele, comunique com seu cheiro sem a adrenalina, (que é o mesmo cheiro do predador antes do ataque), que você está lá para começar uma nova fase com ele.

O potranco, como uma criança, está saindo do jardim da infância dos potros, para ser alfabetizado, e você lembra do primeiro dia na escola? O que você esperava, o que você sentia quando a mãe ou o pai te deixou naquele local estranho?

Cavalos sentem mais ou menos o mesmo, só que pior, porque tem medo de dor e de morrer.

Então todo caminho do aprendizado, quando feito na linguagem dele, no tempo dele, sem sofrimento à toa, é um caminho que ele faz mais feliz, sai da baia sabendo que bom, vou trabalhar com o parceiro que permite que eu aprenda.

Do primeiro contato, ao redondel, ao piquete, ao trabalho de chão, a construção de músculos na nuca e pescoço, a conformação da boca, antes de ir para cima, cimentam uma base de confiança e quando precisar pedir, ele já terá equipamentos físicos para responder sem sentir dor e vai fazer melhor.

Namastê

Quando vamos ensinar algo novo, ler, o cavalo, sentir o cavalo, pedir e quando ele fizer menção de responder, aliviar a pressão do pedido e confirmar a ele, sim é isso que eu quero.

O certo deve ficar fácil e o errado difícil, isso do ponto de vista do cavalo, significa, se escolheu errado ou não compreendeu o que pedi, volto à etapa anterior, ensino de novo, repito, e sempre termino o treino com algo que ele já soube fazer e fez bem, ah e agradeço e cumprimento ele com afagos firmes no pescoço cada resposta correta, isso vale mais que as tais guloseimas que não devem ser oferecidas, porque ele não associa o presente a ter feito certo, essa não é linguagem dele. A linguagem dele é pressão e alívio e ele aprende quando aliviamos e aí dizemos, é isso que pedi a você fazer.

RECONHECER QUE CADA CAVALO É UM SER ÚNICO E DIFERENCIADO

Hoje nesse novo encontro com Você, começo destacando que um bom manejo da criação, com as boas práticas do Horsemanship (a compreensão da Natureza do Cavalo e a comunicação com eles do ponto de vista e no tempo de cada cavalo), ajudarão a amplificar as boas qualidades do seu companheiro de jornada, reduzir respostas de fuga e medo e tornar o cavalo ainda mais acessível a um número crescente de pessoas que amam esses seres especiais.
Além da lida de campo, da preparação para as provas de freio, laço comprido, apartação, concursos de marcha, provas funcionais, onde reside um verdadeiro campo de testes de criadores, treinadores, escolarizadores (domadores), o cavalo, também pode ser colocado a serviço de pessoas que os utilizarão como o Cavalo de lazer da família.
É nesse sentido, que destaco – desde as primeiras sessões de escolarização, feitas do chão, seja para cabrestear, trabalhar na guia, e formar a boca e a nuca, desde o trabalho de base, que o treinador encarregado dessa escolarização, da apresentação a cada dia  de uma novidade na vida do Cavalo, – deve reeducar seu poder de observação, o chamado “feeling”, a capacidade desejada de sentir o mundo e ler as novidades do ponto de vista do Cavalo – que estes profissionais tem de refinar essa leitura partindo do reconhecimento de que não existe regra fechada, não existe a técnica ideal, antes de tudo, existe o reconhecimento de que cada Cavalo é único, tem sua história, sua herança genética, comportamental, tem seu tempo próprio de responder, de sentir que pode confiar na gente e assim fazer a escolha que esperamos que ele faça.

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Quero dizer com isso, que temos sim um planejamento geral para cada passo da “doma”, mas o tempo para isso acontecer passa e muito pela realidade de cada cavalo, que não deve ser castigado, agredido por não responder no tempo esperado.
E se ele não responde, pode ser porque não entendeu o pedido, não lhe foi dado o tempo para confirmar a resposta, (através do alivio da pressão), ou lhe foram pedidas as coisas de modo contraditório, a linguagem deles é essencialmente corporal e quantas vezes vemos o peão pedir uma coisa com as pernas e outra diferente com as mãos e o corpo?
O que dá certo com um cavalo, nem sempre será repetido com outro no mesmo tempo e com a mesma eficiência. Não reconheço truques, atalhos e corretivos que na maior parte dos casos o Cavalo não sabe porque está levando.
Acredito na dedicação, no trabalho abnegado, no amor pelo Cavalo, como regra de ouro para obter as respostas que esperamos. Assim faremos cavalos confiáveis, cheios de energia e ao mesmo tempo amorosos com as pessoas, das quais eles não precisarão temer ou fugir.

COMO BUSCAR O EQUILIBRIO FÍSICO E MENTAL DO CAVALO

Poder perceber essa condição no Cavalo é consequência natural de nosso compromisso de ver o mundo do ponto de vista do Cavalo, o exercício do “feeling”, uma das bases do bom relacionamento com ele.

Se eu não estiver preocupado em como ele está quando o tiramos da baia ou quando o pegamos no campo para trabalhar, e se para mim tanto faz esse estado mental do Cavalo, a chance de criar problemas para ele, principalmente na fase de doma, é muito maior.
Quantas vezes observo treinadores e donos de cavalos agirem como se estivessem acionando um carro, ou moto, como se o cavalo não sentisse nada, não pudesse estar em um dia ruim, ou ter ocorrido alguma coisa que alterasse o estado geral dele.
Nesses casos, o cavalo sai da baia encrispado, com o pescoço contraído, olhos arregalados, no limite de uma “faísca” para ele explodir em fuga daquilo tudo.
Ou sai cabisbaixo, já esperando pelo pior e sem vontade ou sem energia.
Nesses momentos que um bom treinador, um bom tratador faz a diferença. Não é porque temos nosso programa a seguir, que iremos adiante custe o que custar.

PARAR E OBSERVAR TUDO EM TORNO DELE E ELE EM ESPECIAL

Cavalos, já se sabe, sofrem de indisposições (mesmo sem estar caracterizada uma cólica), podem sim começar o dia mal … (mal estar, mal humor, dor, cansados mentalmente, estressados fisicamente), enfim um bom número de situações que se não forem bem identificadas a tempo, podem agravar um problema, criar uma resistência que pode terminar em conflito.

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Na abordagem baseada no “horsemanship”, temos que nos educar a observar sempre o cavalo de um modo integrado, “holístico”, isto é ver que o Cavalo não é apenas a parte física, tem a mental e mesmo espiritual, como nós humanos.

Não é difícil entender que depois de uma prova, de uma viagem, de um treinamento estafante, a condição geral da baia, do lugar, um trato que não fez bem, incômodos causados por moscas em excesso, irritação, fazem o dia seguinte deles tão complicado como para nós.

Então o cuidado integral, nos obriga a ler o ambiente, a ler a situação geral das baias, os outros animais, tentar ver se não aconteceu algo durante a noite que os agitou mais que o normal, e desse modo, poder propor ao Cavalo, uma atividade distencionante, que seja uma distração mental e uma atividade física leve.

Em alguns haras ou Ranchos ou cabanhas estruturadas depois dessas situações tem um ducha, uma hidromassagem dentro de um tanque, mas em qualquer estrutura, ao percebermos uma alteração no estado do Cavalo, seja de que tipo for, podemos alterar o programa de treino daquele dia e fazer uma saída mesmo desencilhado até a beira de um riacho, um tempo de pastejo a seu lado, onde acontece também uma comunicação baseada em respeito e confiança entre eles e nós, naquela linha do “tentar ver o mundo como eles”.

NA PRÁTICA

Criar e treinar um Cavalo exige trabalho, e é nossa responsabilidade criar um ambiente com equilíbrio entre nutrição e treinamento, hospedá-lo com higiene acima de tudo,  conforto térmico, cama boa sem pó e seca, com espaço mínimo de 3 x 3,30m, se possível com contato visual e ou físico relativo, com seus vizinhos. Essa abordagem considera-o como um todo, físico e mental.
O principal é saber qual é o comportamento normal do cavalo, para poder identificar alguma alteração física ou mental.
Assim, em repouso e em um dia em que ele esteja mostrando sua atenção, vitalidade, meça e anote os batimentos do coração por minuto, a frequência da respiração, anote sempre a média de vezes que ele defeca durante a noite, veja a qualidade e consistência, a umidade (brilho) dessas fezes, porque esses todos são sinais de que ele está fisicamente bem. Faça um controle regular.
Assim, quando ele demonstrar uma mudança no seu estado de ânimo, comece por medir todos esses indicadores e compare com suas anotações

UM ROTEIRO PARA SUAS OBSERVAÇÕES

Batimento cardíaco: O coração do cavalo bate 35 a 40 vezes por minuto. Em exercício, como ocorre conosco, a pulsação pode mesmo chegar aos 180 batimentos por minuto. A questão é avaliar após o treino quanto tempo ele demora para retornar ao normal.
Mas se em repouso, ele apresentar, por exemplo, uma frequência de mais de 60 batimentos por minuto, ele está agitado ou em stress, por dor, ou outro motivo psicológico. Onde é mais fácil acessar para verificar essa pulsação é na parte de baixo da cabeça, perto do maxilar, na jugular.
Temperatura: no Cavalo ela sobe normalmente até 37 a 38ºC. Um cavalo com 39 a 40ºC está com febre requer atenção. Na dúvida acione com agilidade um Veterinário.
Respiração: eles respiram entre 8 a 12 vezes por minuto, e depois do trabalho ou treino pode chegar a inspirar e expirar 16 a 18 vezes. Para observar a respiração do cavalo, conte o movimento das narinas ou da barriga. Em situações comuns, a respiração do cavalo deve ser imperceptível.
Alimentação: Deve ser controlada por questões de peso, mas para suprir as exigências de acordo com seu trabalho, época do ano, se garanhão ativo ou se égua prenhe ou lactante. Nos animais em geral e no Cavalo em especial deixar de comer é um sinal de doença, de desequilíbrio físico, dor, mal-estar. Ele nunca deixa de comer se estiver bem.
Pelagem: Os pelos do cavalo devem estar brilhantes e a pele com elasticidade. Ao escovar o cavalo, examine os pelos, se estão opacos, grudados, ou que não há descamação da pele. Se o cavalo transpira em excesso, espuma com pouco trabalho, ou se os pelos estão opacos, arrepiados, pode ser início de nutaliose, por exemplo e isso deixa ainda as mucosas esbranquiçadas e ele sem ânimo para nada.
Fezes e urina: Os tratadores são peça chave, a base de uma cabana, rancho ou haras. A primeira leitura dos sinais de saúde são eles que fazem, quando catam e viram as camas todos os dias. As fezes devem estar encorpadas e cair inteiras, rompendo-se quando tocam o solo, devem estar úmidas o que indica a boa hidratação do cavalo. A urina deve ser abundante em jatos levemente amarelados e translúcidos, nada de urina escura e cheia de muco, nesse caso deve chamar o veterinário. Verifique também a quantidade de água ingerida pelo cavalo. Água em excesso ou em menor quantidade do que as necessárias são prejudiciais.
Postura: O cavalo acusa a maioria dos seus problemas através da sua postura e da linguagem corporal, posição do pescoço, cabeça altiva, olhos vivos, orelhas atentas, caudas movendo-se. Veja se ele apoia os 4 membros no chão, examine tendões e boletos para ver se há dor, limpe e avalie as ranilhas para ver se há frieiras atrás do talão, se há podridão de casco e ranilha, se há inchaços, ou se alguma pedra se prendeu na ranilha ou entre a ferradura e a sola.
A alteração de padrão é um importante sinal de doença. Qualquer indicação que lhe pareça fora do comum deve ser informada ao veterinário.
Agitação: Pulsação e respiração aceleradas podem revelar estresse ou perturbação. Além do estado mental natural, o estresse enfraquece o sistema de autodefesa natural dele e é responsabilidade nossa mantê-lo equilibrado física e emocionalmente.
Escolarizar, treinar, competir, trabalhar com cavalos é um privilégio e uma responsabilidade para quem escolheu viver perto deles. Na visão do Horsemanship, olhamos tudo a todo momento, integrando as informações que temos com a que o Cavalo nos passa. Basta estar comprometido com ele, focando seu bem-estar e os resultados saltarão aos olhos.

Respeitar a Natureza do Cavalo e seu Direito de Usar seu instinto de auto-preservação

Com muita satisfação há oito meses tenho podido colaborar com uma coluna na bela revista da ABCCC (Cavalo Cioulo),o que tem sido uma ótima oportunidade de conversar sobre a filosofia do Horsemanship para criadores de um dos nossos Estados com maior tradição no Cavalo e onde a cultura de raiz e a vida do gaúcho se entrelaça com o cavalo na lida, na musica e no dia-a-dia.
Decidi dar sequencia no nosso site com um resumo do que já foi publicado na Revista Cavalo Crioulo e porque entendo que as milhares de pessoas que amam o Cavalo e seguem nosso site e nossa página também podem ver utilidade nesses conceitos.
O horsemanship se apóia em alguns conceitos chave.O uso do “Feeling” (capacidade de ler o cavalo e sentir o que o cavalo sente a cada momento no seu relacionamento diário conosco), alguma coisa como ver o mundo como se fosse o Cavalo. O tempo, que é sempre o do cavalo e não o do nosso relógio. Cada cavalo tem seu próprio tempo de resposta. E o “balance” que é quando solicitamos alguma coisa a eles. Nesse momento entram os conceitos de pressão e alívio, sempre destacando que o cavalo aprende quando se alivia a pressão no exato instante em que ele faz menção de responder “corretamente” o que lhe pedimos.
Na nossa vivência esses conceitos servem como balizadores do manejo, criação e do treinamento. Esse texto se deidca aos dois primeiros desses conceitos. Começo por eles porque são como separadores de campo, a partir da nossa atitude diante deles, tudo o mais segue uma ou outra direção.

Assim, bem ao espírito de uma prosa na roda de mate, começo recuperando a ideia central da filosofia chamada de “Horsemanship”: uso da nossa intuição (“feeling”) como ferramental para ler, observar, sentir o cavalo, o esforço de tentar ver o nosso trabalho com eles, do ponto de vista deles, o que faz sentido na mente do cavalo? O segundo ponto deste tripé é o tempo, cada cavalo tem o seu tempo de resposta, de reação, fuga, aceitação que nos é dada generosamente quando ele pode sentir-se seguro ao nosso lado e que pode confiar que não colocaremos sua segurança em risco; por fim o terceiro tripé é o do pedido de ação, o “balance”.
E esse tripé desta filosofia de trabalho está alicerçado no conceito que chamei separador de campos: Respeitar a Natureza do Cavalo e Reconhecer o Direito do Cavalo usar sempre seu Instinto de Preservação diante de nós.
Sei que há alguns que chegam a dizer que isso seria uma “frescura”. Mas não é.
O Cavalo na Natureza é um animal predado. Ele serve de alimento a predadores. Algumas diferenças básicas até na morfologia definem essa condição. Por exemplo, a posição dos olhos na lateral da cabeça, obliquios, e não frontais como o dos canídeos, dos felinos… e os nossos.
Isso separa os campos. Nós, por tudo que somos e fazemos, do que nos alimentamos, pela adrenalina que exalamos, com o mesmo cheiro que a dos predadores na hora do ataque, estamos classificados, na memória olfativa do Cavalo que ele traz nos genes da espécie, como uma ameaça.
Se quisermos construir algo duradouro e obter do Cavalo não uma obediência pelo medo, mas uma adesão voluntária, para que ele dê o melhor das suas forças no trabalho, nas provas, devemos criar a condição para ele fazer a melhor escolha, para o que é necessário (ou certo) ficar fácil e as respostas naturais de medo, fuga e autodefesa (que seriam erradas do nosso ponto de vista) ficarem difíceis.
É por essa razão que ao sinalizar esse caminho, que faz mais sentido na mente do Cavalo, que reforçamos sempre que o cavalo aprende no exato instante que aliviamos a pressão, cavalos na sua natureza querem conforto mental e segurança e o alivio da pressão dá essa condição natural a eles. Com essa simples compreensão, no tempo de cada individuo, eles entendem que ao nosso lado não há ameaça e risco.
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Quando ao contrário queremos mostrar quem manda, ou faça isso senão lhe acontece aquilo, (peias, chicotadas) o primeiro que conseguimos fazer é confirmar a eles que tem toda razão em sentir medo e querer fugir de perto de nós, e é isso o que todo treinador deve evitar. Queremos e aqui fazemos isso, ter o cavalo voluntariamente ao nosso lado, como parceiros para tudo, os encilhamos soltos pois ficam junto de nós todo o tempo.
É justamente por esse caminho que reabilitamos mentalmente cavalos mal tratados que incorporaram a necessidade de autodefesa, as reações naturais de morder, escoicear e manotar. É pelo conjunto desse posicionamento inicial, que comunicamos que não precisam disso quando estão com a gente.
Parece simples, mas não é tão simples, principalmente se nos deparamos com um “taura” que desde cedo precisou aprender a defender-se.
Mas, os três pilares básicos do “Horsemanship”, (observar, respeitar o tempo, saber pedir e aliviar a pressão), junto com o conceito central de respeito à natureza do Cavalo como animal de fuga, que pode exercer seu direito de autodefesa, até compreender que não precisa usá-lo quando estiver conosco, nos abrem um imenso caminho seguro e afirmativo para treinar nossos Cavalos.

Horsemanship, o bem estar do Cavalo e o aprendizado com as atitudes das pessoas

Aqui quero compartilhar algumas reflexões a partir do trabalho que realizo com Cavalos, a partir de referências como Ray Hunt, Tom e Bill Dorrance, Buck Branamann entre outros.
Sempre cito esses 4 mestres, porque não foram igualados na sua compreensão da alma, da natureza e da linguagem do Cavalo.
Só a pratica constante e o convívio com dezenas de Cavalos diferentes dia –a-dia nos permite exercitar o “feeling”, a capacidade de ler as necessidades deles a cada momento, a cada novo desafio no trabalho, a vivenciar de verdade que a chave de ouro de toda essa história é que o criador, treinador, deve esforçar-se mais e mais e sempre, para tentar ler o mundo do ponto de vista de cada Cavalo, que são únicos e irrepetiveis.
Não há como ensinar a fazer alguma abordagem com alma, em um DVD, em um livro ou apostila de técnicas, porque técnicas não servem para muita coisa, se faltar a capacidade de ler, interpretar e principalmente sentir a emoção que o cavalo sente naquele instante, principalmente quando falamos de manejo, de saúde e de escolarização.
Quando pegamos uma potra, com histórico de medo e alguma violência, de susto e fuga a cada movimento seu, e entramos com ela em um redondel e logo depois de duas, três sessões vemos ela entrar diferente, vemos ela no começo fazendo um esforço imenso para poder confiar e sentir-se segura a seu lado e pouco a pouco vemos ela superando a fuga, escolhendo a aproximação, isso de verdade não tem o que pague.
Mas, não existe fórmula pronta para nada. Quase sempre o que deu certo com um, não dá necessariamente com outros.
Ou, por exemplo, quando chega a hora de escolarizar um potro (a) de três anos, que teve uma boa história com a gente, desde o nascimento, desde o imprinting e nos deparamos com um animal mais assertivo, mais responsivo e solto, confirmamos que está fazendo sentido o que propomos.
Mas, do mesmo modo, essa criação positiva, não esgota tudo, senão seria fácil demais. E quando o potro, criado do mesmo modo, mas filho de uma égua por natureza defensiva e desconfiada, mesmo tendo sido apartado aos seis meses, e bem manejado, cresce e reage às novas situações do mesmo modo que sua mãe; será a genética com influencia no comportamento? Ou será que esse individuo demanda um tempo próprio, um tempo seu, para começar a responder? Por isso não tem formulas magicas no bom Horsemanship.
Cavalos, cada um deles, me ensinam muito, sobre si mesmos, suas histórias duras ou boas, antes de chegar aqui… curiosamente tenho atraído mais, aqueles que precisam de mais ajuda.
Mas esses cavalos, éguas, potros, me ensinam também, muito sobre seus donos, sobre caráter, índole, personalidade das pessoas que de algum permitiram, consciente ou inconscientemente, que eles tivessem passado por duras provas.
Via de regra, o cavalo não comete enganos, equívocos, ele apenas indica, comunica e pede uma nova solução para ele. Se eu for capaz de entender, interpretar, ler e responder as respostas vem claras, limpas e carregadas de energia, de felicidade.
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Tem sido assim. Cavalos não precisam provar nada, não tem ego a ser satisfeito, apenas são e isso é bom demais. Nesse particular ensinam às pessoas que é preciso trata-los de igual para igual, e se transportarmos isso para nossas relações, ensinam humildade.
Já seus donos, ex-donos, ao contrário “jogam para a torcida”…como se diz na gíria.
E com isso, ao ler e compreender um cavalo, quase que clinicamente, recebo muita informação sobre os donos, comportamentos, compromissos, vaidades, exibicionismo social, às custas do Cavalo.
Eu já escrevi um artigo (neste site), sobre o que significa a decisão de ter um cavalo. O titulo já clareia: ter um cavalo é assumir encargos de enormes responsabilidades. Tal qual um filho, que tem necessidades não materiais a serem atendidas. Resumindo: cavalos pedem donos responsáveis
e C_O_M_P_R_O_M_E_T_I_D_O_S com eles.
Assim, como troca de idéias, sem qualquer pretensão de posar como dono da verdade, vou ensaiar uma crônica e falar sobre o que os cavalos me ensinam sobre as pessoas:
– É muito gratificante ver como o Cavalo é um veiculo de superação pessoal. Donos que honram seu compromisso e vivem uma troca efetiva com seu cavalo. Aprendem, estudam, evoluem, agreguam novidades e mantém o foco no bem estar do seu equino. Vibram com cada vitória ao lado do seu Cavalo, e constroem esse caminho de crescimento juntos. Esses são os que fazem valer a pena todos os esforços.
– O mais divertido são os participativos, chova ou faça sol estão com seus animais, observam comportamentos, mostram que estão no caminho de treinar seu “feeling” pessoal, comentam, assumem tarefas, gostam de recompensar seus animais com banhos e duchas depois do trabalho, vivem o clima das cocheiras e sentem-se bem com essa possibilidade.
_ Há o dono que mantém uma “distância higiênica”do cavalo. Postura mais comum em certos esportes hípicos, o cidadão chega à pista liga para a cocheira pede que tragam o cavalo selado, ja de luva, nao tem efetivamente um contato com o Cavalo. Usa, liga ao tratador e o devolve sujo e suado.
– Há outro extremo, o dono “tatibitati” – aquele que diz amar o Cavalo, mas entende que deve relacionar-se com ele como se relaciona com um bebê mimado, coloca-se como supridor de cada vontade (desejo) que ele, dono, imagina ser do Cavalo e trata de supri-lo. Dirige-se ao Cavalo na linguagem que adultos usam para estragar suas crianças… o tatibitate… (nhém, nhém nhém, meu bebezão, fofão, gostosão, neném da mamãe…) e não de igual para igual, não esforça-se para compreender a natureza do equino e seu papel na natureza e na nossa vida, e tentar, mesmo por um instante, ver o mundo do ponto de vista do Cavalo e assim promover o bem estar e o que faz sentido na mente do Cavalo.
É cenourinha com mel, maça com torrão de açúcar, mamão e melancia, rapadura, e por ai vai. Cavalos não atendem ao mesmo código de reforço positivo que um cão. Sua natureza é de predado, e eles querem sentir-se seguros e poder confiar nas pessoas. Claro que aceitam as guloseimas, porque são saborosas, mas não correlacionam naturalmente com respostas e comportamentos. Há quem diga o contrário. Pegue então um animal agredido, xucro, de fuga à flor da pele e tente escolariza-lo desse modo. É chão, contusões, “manotaços”, coices etc. Creio mesmo que alguns “show horses”, mistificadores, são responsáveis por isso.
-Outro tipo faceiro que vez por outra aparece nos ranchos é o que faz declarações, juras de amor pelo Cavalo, “que o ama, que quer o melhor para ele”, “por isso estou trazendo ele aqui para um manejo diferente”… mas, que passam um ano e visitam o cavalo duas vezes de duas horas e duas vezes de quarenta minutos.
Amor, estranho amor, nem um de nós e menos ainda o Cavalo querem esse tipo de amor, que faz mal, abandona, não assume responsabilidade com o Cavalo e nem se dispõe a aprender com ele, melhorar sua equitação, nada. Limita-se a pagar as baias. “ Ah! eu sei que ele está bem”.. consciência fica em paz. Ora, porque investiu e comprou um cavalo então? Podia comprar uma moto, uma moto náutica, uma super bike, esses ficam lá, quase nada pedem e os atendem quando solicitados.
– Nessa linha há os que fazem um baita discurso de amor, trazem o cavalo, e além de sumir, sabem que o nosso compromisso é com o Cavalo e não com os donos, e ai param de pagar, ora por meses, ora por quase um ano, ou senão atrasam de modo contumaz todos os meses, o único compromisso que o ligava ao seu cavalo era o de pagar a pensão. Mas o Cavalo dele come todos os dias, entre 3 e 5 vezes por dia, dependendo do uso… “ aH, mas lá onde ele tá… eles amam o Cavalo” e aí ainda escrevem .. “ me mande fotos do Cavalo”…
-Há os que têm seus desafios e problemas lá fora, como todas as pessoas sem exceção, mas na sua visão, os seus problemas são os maiores, os mais difíceis e mais agudos que os dos outros. Estes deixam transparecer que o Horsemanship deve ser uma “equoterapia” para humanos e ao trazer seus diversos problemas para onde o cavalo passa a viver, se fazem de vitimas das varias situações da vida e emendam isso com um pedido do tipo… “dá para pagar menos?”… ou pago quando puder? Outro dia mesmo um cidadão disse ter seis cavalos e queria hospedá-los no Rancho. Ao saber do custo da pensão falou com muita naturalidade: – Há mas são seis, Voce tem de dar um desconto… ora, são seis bocas, seis camas, seis vezes mais escovações, mais trabalho, portanto não tem como aplicar ganho de escala nisso.
– Nessa mesma linha estão os que, além de tudo, acrescentam à sua conduta o fato de não assumirem nenhuma responsabilidade sobre tudo que aconteceu de ruim ao seu animal antes de traze-los a locais mais sérios e comprometidos. Já vi casos escabrosos, diversos, que também ensinam… pela dor. Vi égua chegar aqui pele e osso, (hj não aceitaremos mais animais assim por tudo que isso pode representar ao organismo e metabolismo do equino), com cascos podres, com síndrome de dança do urso, … dizendo apenas, olhe como ela ficou lá onde estava.. e você bem intencionado se for distraído, julga… que absurdo …isso são maus tratos…mas não da outra cocheira, e sim dele que como dono nem observava seu Cavalo. Só com o tempo descobrimos que o dito cujo havia ficado 9 meses sem pagar o local e em muitos locais, “se não pagou um mês, a comida é cortada”. A maioria dos locais toma ou vende o cavalo abandonado para quitar a divida, mas para mim é inaceitável tirar a comida do Cavalo que como sempre digo, não tem culpa do dono que tem.
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Vi também animal com 9 anos, sem poder comer porque sua boca nunca tinha tido os dentes sequer grosados, em toda a vida, eram pontas e feridas por todos os lados, na língua etc… éguas que já tinham tido cólicas e isso nunca foi devidamente dimensionado e descrito pelos proprietários, sem ter recebido qualquer vacina, com doenças neurológicas e ao nos depararmos com situações criticas temos de ouvir… “ – vocês sabem do nosso amor por ela”???
– Há o dono de cavalo que faz o tipo “não to nem ai, cavalo é para ser usado”, se não fizer o que quero, “sento-lhe o relho”, esses convivem mal, mas convivem com o cavalo. Felizmente podem aprender… mudar de atitude, melhorar em vários sentidos, graças a terem adquirido uma compreensão do que é um Cavalo, do que é ter um Cavalo, verdadeiramente. Como gostam de montar, e de fato gostam de viver momentos com seus animais, esses são difíceis no começo, mas são bem melhores de conviver que o do tipo anterior.
Felizmente, nessa jornada com o Cavalo, nas ultimas décadas, os casos mais positivos são maioria, mais fortes e que demonstram como o cavalo faz bem aos humanos .
O compromisso com o Cavalo, para mim, implica sim em reeducar, sensibilizar e promover mudanças no comportamento e na relação entre os donos de cavalos, seus animais, os profissionais que lhes atendem e o contexto de um projeto que se propõe a ser um núcleo de conhecimento sobre a Natureza do Cavalo.
Um Programa Mínimo para Proprietários
A mudança ocorre naturalmente, sem conflitos, na medida que essas pessoas entenderem:
a)O cavalo pede pessoas verdadeiras
b)O cavalo pede ações constantes em prol de seu bem estar (não só em discurso)
c)O cavalo exige compromisso e comprometimento com suas necessidades diárias desde as mais simples, baia ampla, seca e limpa, agua fresca a vontade , volumoso de qualidade e concentrado adequado às suas necessidades, passando pelas rotineiras, escovação e rasqueamento, casqueamento e ferrageamento mensal, vermifugação trimestral, grosagem de dentes anual, vacinação anual, até as mais complexas como…
d)vinculo afetivo e compreensão dos sinais que ele nos dá.
e)Uso de equipamentos profissionais de boa qualidade e e em bom estado, que custam um valor razoável, inclusive quando tem de ser reformados ou readequados.
f) Programa de treinamento, uso e trabalho de chão e montado mais de uma vez por semana. Quer ter um cavalo? Você irá montá-lo regularmente? Está disposto a conviver com ele? Se não for assim, não o tenha.

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Claro que se o seu cavalo começasse a emagrecer sem justificativa aparente, começasse a ter hábitos incomuns em comparação com outros equinos, algo teria de ser feito, e um dono responsável e consciente ao chegar onde vive seu cavalo deveria observar isso com quem ele contratou a hospedagem. Mas isso só pode ser feito se os donos comprometidos estiverem regularmente com seu Cavalo.
Portanto se é para ter um cavalo pela metade, sem compromisso, sem meios, sem possibilidade material ou pessoal ou emocional de atender esse programa mínimo, acima, NÃO TENHA UM CAVALO, eles não merecem e não precisam de donos assim.
Sem a menor pretensão de ditar regras de conduta, felizmente para a maioria das pessoas com que nos relacionamos em função do Cavalo, essa compreensão aumenta ano a ano. Para o bem do Cavalo em geral, da qualidade de vida deles e da felicidade que eles podem dar a seus donos, eles pedem isso.