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Hoje, mais do que nunca, se evidenciam os cuidados que o homem deve ter com as questões de meio ambiente. Um dos itens ligados a este tema e que vem ganhando a cada dia mais espaço, é o destino a ser dado aos sub-produtos ou resíduos nos diferentes tipos de atividades, quer seja de produção ou consumo, podendo-se encontrar inúmeros exemplos atuais para ilustrar este fato.

Nas atividades ligadas ao cavalo, seja em centros de treinamento, lazer ou reprodutivos, temos como o principal sub-produto, os resíduos oriundos da estabulação (cama, fezes e urina). Estes, representam um importante composto orgânico que deve ser adeqüadamente manejado antes de ser reintroduzido ao meio ambiente.

Fazendo-se uma rápida reflexão, verificamos que este sub-produto, na maioria das vezes, não recebe a atenção que deveria, sendo normalmente depositado a campo ou em instalações que servem simplesmente de depósito diário ou até a sua retirada. Em contrapartida, as conseqüências negativas ligadas a ele palpitam no dia a dia se evidenciando em custos no controle de doenças parasitárias, perda de rendimento dos animais pelo estresse que é submetido, além de outras questões relacionadas à saúde do eqüino e à saúde pública, oriundas da proliferação demasiada das moscas que geram um grande desconforto pela presença das mesmas nas baias, corredores, casas, restaurantes e demais instalações internas e mesmo vizinhas ao local onde os eqüinos encontram-se alojados. Esta situação se agrava nas regiões ou épocas de clima quente e úmido, condições ideais para o desenvolvimento das espécies Musca domestica (mosca doméstica) e Stomoxys calcitrans (moscas dos estábulos), que utilizam o resíduo animal como substrato básico de postura e desenvolvimento da fase larval do ciclo evolutivo.

O controle destes dípteros indesejáveis, na maioria das situações, se faz com a utilização de produtos inseticidas, que atuam como larvicidas ou adulticidas e representam um custo fixo para o controle e que por vezes não é alcançado. Por outro lado, os parasitos gastro-intestinais têm plenas condições de completar o ciclo evolutivo, uma vez que o esterco não sofra nenhum tipo de procedimento sanitário.

O objetivo desta publicação é alertar os amigos do cavalo para a necessidade de adotar uma postura preventiva e definitiva no controle de moscas nos centros ligados à atividades hípicas, visando um melhor controle dos mesmos, a fim de evitar transtornos sociais, econômicos e no rendimento dos eqüinos, uma vez que está metodologia, depois de implantada resolve definitivamente a questão.

A medida mais importante para que se obtenha um bom controle sanitário sobre o resíduo eqüino, tem como base o recolhimento integral do resíduo produzido para uma instalação onde o mesmo possa ser exposto ao processo de fermentação aeróbica, monitorado. Embora a instalação utilizada para o manejo sanitário seja fisicamente semelhante às chamadas “estrumeiras”, deve-se lembrar que o resultado é bastante diferente. Basta verificar que muitos centros hípicos que utilizam simples depósitos de resíduos, convivem com um problema constante de tentar eliminar o excessivo número de moscas existentes, uma vez que estas encontram nestes depósitos, condições ideais de concluir o ciclo evolutivo sem obstáculos. Para transformar estes resultados, detalhes da construção fazem a diferença.

Processo de decomposição dos resíduos

Por tratar-se de resíduo sólido, em função do sistema utilizado na estabulação dos eqüinos, compreende-se como tal, a mistura do esterco e urina com a cama que varia regionalmente, dependendo da disponibilidade, da maravalha à casca de arroz ou palhas de origem diversa. Esta interação do esterco com a cama, é importante para que haja no composto uma estrutura física e química adequada, permitindo um bom processo de decomposição, efetuado pelos microorganismos que se encontram normalmente no trato digestivo dos eqüinos. Este processo de decomposição do material orgânico pode ser aeróbico ou anaeróbico dependendo da presença ou não de oxigênio. Em ambos os casos, ocorre a decomposição dos hidratos de carbono e das proteínas como segue:

Processo
Substrato
Produto Final
Aeróbico Fermentação
Hidratos de Carbono
CO2, H2O e calor (até 80 C)
Putrefação
Proteínas
CO2, Amônia e alteração do pH
Anaeróbico Fermentação
Hidratos de Carbono
CO2, H2S e metano
Putrefação
Proteínas
Aminas incompletas (mau cheiro)

Como pode-se observar na tabela acima, do processo aeróbico resultam alterações de temperatura e pH que são fundamentais para o controle sanitário do resíduo. Para que se consiga um processo de fermentação aeróbica adeqüado, e com isto uma elevação significativa da temperatura pela degradação bacteriana dos hidratos de carbono, é necessário que sejam observados alguns aspectos como:

– relação da quantidade de cama e esterco;
– pouca compactação no composto;
– reciclagem do líquido resultante da biodegradação (chorúmen), dependendo das alterações obtidas na temperatura do composto.

Com isto, consegue-se expor o resíduo recolhido a uma variação de temperatura que pode chegar a 800 C que, juntamente com a alteração do pH, irá inviabilizar os ovos e larvas dos parasitos em questão. Na minha experiência, em diferentes trabalhos em andamento, pude verificar que as referidas alterações de temperatura e pH, chegam a tornar inviável a germinação de sementes de invasoras (plantas daninhas) quando do uso de casca de arroz. Usemos como exemplo o ciclo evolutivo da mosca doméstica:

Ciclo evolutivo da mosca doméstica:

A mosca doméstica apresenta metamorfose completa, passando por quatro estágios de desenvolvimento bem definidos: ovo, larva, pupa e adulto. Os ovos, pequenas estruturas brancas e brilhantes são depositados usualmente no esterco dos animais domésticos em locais escuros e protegidos do sol. Cada fêmea adulta pode depositar até 120 ovos por postura, podendo haver seis posturas durante sua vida reprodutiva. Após a eclosão dos ovos, que varia de 8 a 24 hs, as larvas se desenvolvem no material orgânico sob condições ideais num período de 3 a 7 dias. Após este período, as larvas migram, buscando local seco para a fase de pupa que dura de alguns dias a várias semanas, conforme as condições de clima. Dependendo do desenvolvimento larval, será o tamanho do adulto, que eclode após a fase de metamorfose na pupa. O tempo médio de vida de uma fêmea adulta, varia de 2 a 10 semanas dependendo das condições climáticas e o ciclo completo, de ovo a ovo, pode completar-se em 8 dias.

Da mesma forma, a mosca dos estábulos apresenta um ciclo evolutivo com quatro fases de desenvolvimento, ocorrendo a postura de ovos em restos de ração umedecida e fermentada, além de esterco misturado na palha e alfafa. Diferem por apresentar aparelho bucal picador e sugar o sangue de eqüinos. Com isto, causam o estresse do animal pela ação mecânica e perda de sangue, e redução do peso e performance esportiva.

Participam ainda na transmissão de algumas doenças infecto-contagiosas como anemia infecciosa eqüina e algumas tripanossomoses como o mal das cadeiras causada pelo Trypanossoma evansi, existente principalmente na região central e norte do Brasil.

Com relação aos parasitos gastro-intestinais, cabe lembrar que todos são eliminados via fezes na forma de ovo ou larva, onde vão chegar a fase infectante após período que varia conforme a espécie do parasito. O Gasterófilos, por sua vez, cochecido como berne do estômago, também é eliminado nas fezes na forma de larva, e a partir daí busca um local seco para pupar e transformar-se na mosca adulta e reinfectar o cavalo.

Todas as espécies citadas acima, ao serem expostas as variações de temperatura obtidas no processo de fermentação aeróbica por tempo prolongado, serão eliminadas, interrompendo a evolução natural do ciclo evolutivo.

Para facilitar a limpeza das instalações e recolhimento dos mesmos, o piso das baias, corredores e imediações deve ser construído de forma a facilitar a limpeza e evitar o acúmulo prolongado de cama úmida, esterco ou mesmo ração. Sabendo-se que uma mosca adulta pode produzir até 120 ovos por postura, fica simples o entendimento que estes detalhes fazem muita diferença no resultado final. Abaixo estão ilustrados alguns dos parasitos que se desenvolvem junto ao esterco dos eqüinos, juntamente com os possíveis danos causados:

Agentes
Produto Final
Mosca doméstica Transtornos severos na higieneVetor de doenças ligadas à saúde pública Intenso desconforto social Hospedeiro intermediário do Habronema (esponja de verão)
Mosca dos Estábulos Hematófaga: perda de sangue e estresse para o eqüino Transmissão de doenças como AIE e mal das cadeiras
Gasterófilos Parasita do estômago, causando transtornos que variam de cólica a rupturas gástricas
Grandes estrôngilus Diarréia, anemia, perda de apetite, perda de peso, cólica e etc.
Pequenos estrôngilus Diarréia, perda de peso, redução da performance esportiva
Habronema Lesões gástricas, esponja de verão

Os agentes citados acima, desenvolvem, obrigatoriamente, uma fase do ciclo evolutivo nas fezes frescas do eqüino. O aumento de temperatura que ocorre no processo de fermentação aeróbica, na decomposição do esterco fresco, interrompe portanto o desenvolvimento dos mesmos.

Observado os dados contidos acima, verifica-se que realmente o problema das moscas e todos os prejuízos ligados aos parasitos que se utilizam do esterco animal como substrato para o desenvolvimento do seu ciclo evolutivo, pode ser resolvido de forma eficiente e definitiva, bastando para tanto adotar as medidas necessárias para alcançar tais objetivos.


*ATENÇÃO

O autor deste artigo está disponibilizando esta metodologia de baixo custo, por acreditar que seja de muita importância para aqueles que convivem com animais. Para os interessados, favor entrar em contato pelo e-mail do autor jicanto@pro.via-rs.com.br, ou pelos telefones (55) 223-3705; (55) 9996-5205.

Autor: João Ignácio do Canto – CRMV 4193 – RS

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