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Este texto é continuação do anterior, quando falei sobre reconhecer cada cavalo como único. Quando começo com um novo cavalo, em fase inicial de escolarização, costumo dedicar um tempo para observá-lo de perto. Tento ir para a mente dele, lendo os sinais que ele me dá sobre cada novidade que é apresentada a ele, quais são os primeiros sinais corporais que ele utiliza para dizer o que sente a respeito de tudo aquilo.

Essa é a grande diferença, alcançada com o tempo, entre um treinador comum, ou um “horseman”, praticante da linguagem natural do cavalo.

Usar o instinto, a intuição, para ver o mundo do ponto de vista do cavalo e não do seu próprio, pessoal, dominante, preso a prazo, a relógio.

Vai começar a ensinar um cavalo? O tempo é o de cada cavalo e não o seu próprio tempo.

É essa uma das chaves que nos poupa e ao cavalo de cometermos erros básicos que nos levam a um caminho de confrontação desnecessária. E a que tempo eu me refiro? Ao tempo que cada cavalo precisa para compreender o que está sendo solicitado. E como ele compreende? Do ponto de vista da sua segurança. Ele precisa sentir que pode confiar, que não está se metendo em uma enrascada. Precisa confiar no treinador

Tudo porque falhar no inicio, na leitura do Cavalo, nos leva a ações que chegam em ruas sem saída, com ele. Ai, tem de retornar e o prejuízo começa em vários sentidos.

Quando não reconhece isso, o treinador que leu errado, confunde auto preservação e necessidade de sentir-se seguro que o Cavalo manifestou, com teimosia, com desafio, com malacarice e para esses, castigo ou punição.

Justamente aí começam os problemas com diversos cavalos que não explodem todo seu potencial, que não reagem bem ao treino, que não puderam ser francos e que foram na compreensão deles, agredidos sem razão lá atrás.

O treinador de então, confirmou na mente dele, ao errar a leitura nos primeiros dias, que somos sim predadores, perigosos, que nossa convivência é dolorosa e o vivente então mata em vida todo dia um pouco o espirito daquele cavalo.

Isso não é conto de fadas e nem frescura, falando bom português.

Há pesquisas realizadas em Universidades da França sobre comportamento, emoção, memória, capacidade de associar pessoas, cheiros, a situações boas ou ruins que o ser Cavalo têm e nós ao longo de décadas nem sabíamos como era.

Quando um cavalo não atende uma solicitação, feita de baixo ou montado, Você já parou para se perguntar se aquilo já foi ensinado antes? Um cavalo não responde de acordo com o esperado porque ele pode não saber fazer, porque não teve tempo, ou porque o pedido foi confuso. Ou ainda porque a energia do treinador era ruim, cheia de adrenalina, dominância, raiva da sua impotência em fazer ele compreender e aí ele castiga e desconta no cavalo.

Agressões, chicotadas, dor, sempre confirmam a pior impressão dele sobre nós:  a de que somos uma ameaça dolorosa, e o bom treinador nunca deve sentir-se desafiado pelo cavalo. Não se deve querer ensinar algo, deve-se permitir que ele aprenda, no tempo dele e com base em confiança e em saber aliviar a pressão na hora exata, pois eles aprendem no alívio da pressão.

Isso é básico e é onde vejo com certa tristeza, treinadores experientes, ainda querendo quebrar o cavalo, tirar a boca, chicotear, porque sentiram-se desafiados . Observe neste vídeo as lesões que chicotadas na região do vazio causam, acessando o link ou copiando e colando no seu navegador; https://youtu.be/PMfcc0hzGMU . A pele do cavalo é mais fina e com muito mais terminações nervosas (que transmitem a sensação de dor ao cérebro) do que a nossa. Além de que chicotear um cavalo que está perdido no trabalho é também uma covardia.

Então o Cavalo, que é predado na natureza, que é comida para os outros animais, quer o quê?

Quer sossego, quer segurança, quer poder confiar e aí revelar-se um de nossos melhores parceiros milenares, no esporte, no trabalho, no lazer, na vida em geral.

E é nossa responsabilidade saber de tudo isso e agir com ele desse ponto de vista.

O cavalo precisa que nossa aproximação, nosso contato, nossas ações façam sentido na mente dele desse ponto de vista;

– “ Ei, isso que você está trazendo para colocar em mim, é dolorido? É perigoso? Vai me colocar em risco?”

Ou então:

– Amigo, posso te chamar assim? Esse ferro, essas coisas que tu utiliza para me chinchar as costelas são mesmo pra ser usadas desse modo? Não dá pra fazer de outra forma, por exemplo, você me explica certinho na minha linguagem o que quer e confie que eu vou fazer meu melhor”…

Você já imaginou esse diálogo entre o treinador, ginete e seu cavalo, nas primeiras sessões de doma, ou escolarização, como chamamos hoje.

Pois saiba que é exatamente essa a abordagem que faz sentido para eles, só que é claro, sem palavras, mas na linguagem corporal.

Você se aproxima, ele se encolhe, encrispa o pescoço, arrepia pelo, arregala olhos, mostra o branco dos olhos, comprime os beiços, …. o que você faz?

-ah amarro bem curto, jogo as tralhas em cima e vamos pro embate….

Não precisa ser assim.

Não temos duas chances de causar uma primeira boa impressão.

Converse o cavalo, chegue-se sem olhar nos olhos, ombros baixos, relaxado, toque ele de lado, na tala do pescoço, relaxe ele, comunique com seu cheiro sem a adrenalina, (que é o mesmo cheiro do predador antes do ataque), que você está lá para começar uma nova fase com ele.

O potranco, como uma criança, está saindo do jardim da infância dos potros, para ser alfabetizado, e você lembra do primeiro dia na escola? O que você esperava, o que você sentia quando a mãe ou o pai te deixou naquele local estranho?

Cavalos sentem mais ou menos o mesmo, só que pior, porque tem medo de dor e de morrer.

Então todo caminho do aprendizado, quando feito na linguagem dele, no tempo dele, sem sofrimento à toa, é um caminho que ele faz mais feliz, sai da baia sabendo que bom, vou trabalhar com o parceiro que permite que eu aprenda.

Do primeiro contato, ao redondel, ao piquete, ao trabalho de chão, a construção de músculos na nuca e pescoço, a conformação da boca, antes de ir para cima, cimentam uma base de confiança e quando precisar pedir, ele já terá equipamentos físicos para responder sem sentir dor e vai fazer melhor.

Namastê

Quando vamos ensinar algo novo, ler, o cavalo, sentir o cavalo, pedir e quando ele fizer menção de responder, aliviar a pressão do pedido e confirmar a ele, sim é isso que eu quero.

O certo deve ficar fácil e o errado difícil, isso do ponto de vista do cavalo, significa, se escolheu errado ou não compreendeu o que pedi, volto à etapa anterior, ensino de novo, repito, e sempre termino o treino com algo que ele já soube fazer e fez bem, ah e agradeço e cumprimento ele com afagos firmes no pescoço cada resposta correta, isso vale mais que as tais guloseimas que não devem ser oferecidas, porque ele não associa o presente a ter feito certo, essa não é linguagem dele. A linguagem dele é pressão e alívio e ele aprende quando aliviamos e aí dizemos, é isso que pedi a você fazer.

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